A Dança tradicional Indígena, Terena, Masculina e Feminina, passou por três fases na Reserva Indígena de Dourados, apresento o desenvolvimento e evolução da dança de acordo com a realidade vivenciada pela comunidade indígena, residente na Aldeia Jaguapiru, Dourados-MS.
1ª FASE DA DANÇA INDÍGENA TERENA NA RESERVA INDÍGENA DE DOURADOS
A primeira fase da dança típica indígena masculina, Terena está relacionada ao período de peregrinação de nossos antepassados Terena, que se deslocaram do Chaco Paraguaio, após participação nas guerras, andavam de um lugar para outro, até se refugiar nas fazendas, segundo os anciões residentes na reserva Indígena de Dourados-Aldeia Jaguapiru, nesse período de peregrinação, trabalhavam nas fazendas e presenciaram, ações que eram realizadas em devoções aos santos; Durante a peregrinação, alguns indígenas se estabeleceram em Ypegue, onde o ancião da aldeia, era praticante da dança e devotos de São Sebastião, incluiu no traje da dança tradicional indígena terena a fita vermelha e verde, passaram a carregar, a bandeira, a flauta, o tamborim e um violão pequeno, durante os festejos, saiam pelas ruas dançando, tocando e festejando.
Quando os anciões de Ypegue, vieram residir na reserva indígena de Dourados, trouxeram para a dança tradicional essas características dos trajes de devoções, assim o traje típico da dança masculina Terena, ficaram semelhante aos trajes carnavalescos, revestido de papel de seda, fitas nas cores verde e vermelho, dando um destaque colorido, além de cocar com espelhos, carregavam uma bandeira com a imagem de um indígena, símbolos característicos dos devotos; No início não havia muita preocupação com a pintura corporal, pintavam apenas o rosto e as pernas; As famílias que participavam ativamente das danças tradicionais na reserva, eram a Família Valério, Família Joaquim e Família Lili.
O grupo de dança tradicional da reserva indígena de Dourados passou a fazer apresentações em lugares fora da aldeia, no entanto, em São Paulo, foram questionados, sobre seus trajes coloridos, mas não se importaram com os questionamentos, mas, quando estiveram com empresários daqui de Dourados, foram advertidos novamente, sobre o traje, que o mesmo teria relação carnavalesca, sugeriram que a comunidade Terena, apresentassem a dança cultural com mais originalidade, desta forma, ganhariam muito dinheiro, chamariam atenção dos turistas e seriam mais prestigiados, assim aos poucos foram, modificando a característica das apresentações culturais.
Na 1ª fase, na pintura corporal, além do vermelho, preto e branco, usavam a cor azul e verde, que está relacionada com a divisão das famílias terena (Xumonó: cor azul e preto) e Sukirikeono: vermelho e preto).
Seguem abaixo, fotos de arquivo pessoal de Gerson Felipe Valério, na qual demonstra, as características da 1º fase da dança e da pintura corporal Masculina.
Na foto os grupos preparados para uma apresentação, a frente o líder indígena Guilherme Felipe Valério.
Apresentações Culturais na Reserva Indígena de Dourados-MS, em frente a escola Francisco Hibiapina.
indígena da etnia terena, tocando tamborim.
O toque do tamborim, também teve a sua evolução, no início como os participantes da dança eram anciões, o toque era mais lento e pausado, para que pudessem acompanhar o ritmo da dança, na segunda fase da dança, houve alterações no movimento dos passos, como também o toque do tamborim, passou a ser mais acelerado, devido a agilidade do participantes, por serem mais jovens, na terceira fase o toque continuou no ritmo acelerado, um pouco puxado, para que desse tempo, durante a dança de dar a volta circular.
SEGUNDA FASE DA DANÇA TERENA NA RESERVA INDÍGENA DE DOURADOS.
Segundo os turistas que chegavam na reserva para assistir as apresentação da dança Terena masculina, relataram que os trajes eram semelhantes ao do carnaval, queriam ver as danças tradicionais com mais originalidade, segundo Gerson Felipe Valério indígena da etnia Terena e membro do grupo de Tradição Terena daquele período relatou: “ os turistas abriram nossos olhos, despertando a nossa visão sobre a nossa cultura” Valério,Gerson.2022; Desta forma, passaram a usar somente as vestes típicas da etnia, feita com pena da Ema, e a pintar todo o corpo para as apresentações, usando apenas as cores: vermelho, preto e branco, além dos adereços como: colares, cocar, arco e flecha, seguiram a orientação dos empresários e turistas, desta forma começaram a organizar os trajes, sem brilhos e cores luminosas, as apresentações das danças passaram a ser frequentes na comunidade.
A Ema é considerada a deusa do povo Terena, reverenciada durante a dança tradicional.
Seguem fotos que representam a segunda fase da dança:
TERCEIRA FASE DA DANÇA TERENA NA RESERVA INDÍGENA DE DOURADOS-MS
Segundo Gerson Valério, as cores: vermelho, preto e branco, tornaram, cores originais do povo Terena da Reserva indígena de Dourados, passando a ter significado e valor sentimental, além de chamar mais atenção e agradar os visitantes; as pinturas corporais passaram a se destacar com os grafismo, pintados no corpo, e adereços que deixavam o traje mais característico, a pintura facial e corporal, passou a se destacar, nas apresentações, a ideia era, se caracterizar como os parentes indígenas do Xingu, que além de pintar todo o rosto, não economizavam na pintura corporal, pintavam os braços, pernas, costas, com grafismos, nas cores preto e vermelho, muito grafismo, sem perder a essência das cores.
Com o passar dos anos as pinturas corporais foram se diferenciando, pois a falta de matéria prima, fez com que utilizassem o pincel atômico e a tinta pinta cara, desde então, a família Valério, preocupados com essa questão, começaram a plantar, pés de urucum e jenipapo em seus terrenos, pois segundo Gerson Valério a pintura corporal é essencial na dança, principalmente os adornos, que deve representar a simbologia da dança, acompanhados do cocar, arco e flecha ao som do tamborim e flauta, tendo em casa os recursos naturais, não precisariam se preocupar, em buscar tão longe.
Percebe-se que nessa fase, o cocar colorido fica se evidencia, com a inserção de cocares, feito com penas de outros animais, além de colares com sementes vermelhas, a segunda e terceira fase representa um momento de valorização da cultura terena na reserva indígena de Dourados, pois surge uma preocupação em produzir artesanatos para venda e produção de trajes para caracterizar e chamar atenção dos visitantes, nas apresentações, uma maneira de divulgar a cultura e incentivar a comunidade terena na confecção de artesanatos e trajes típicos.
A Reserva indígena de Dourados é multiétnica, possui três etnias (Guarani, Terena e Kaiowá) para as apresentações culturais, toda a comunidade indígena era convidada a participar da dança, nessa fase, muitos líderes indígenas de outras etnias, vestiam os trajes típicos da etnia terena e participavam juntos da dança, todos podiam e ainda participar, desde que sinta o desejo de dançar e festejar.
Segue abaixo fotos característicos da terceira fase da dança Terena
VISITAÇÕES NA RESERVA
O período de visitações na reserva tornou-se uma fonte de economia para a comunidade, a situação precária de muitas famílias indígenas, chamavam atenção dos turistas e estudiosos, visando adquirir recurso financeiro, a comunidade Terena, confeccionava artesanatos como: cerâmica, trajes típicos, cocar, maracá e colares para vender aos turistas, aumentando a divulgação da cultura Terena, mas para fins lucrativos; Gerson Valério era o guia dos Turistas, os acompanhava do hotel onde estavam hospedados até a Reserva, visitando lugares como: Espaço da Tradição Terena e as casas de reza existentes (casa de reza do Getulio e Seu Jorge) com o aumento de turistas, muitas lideranças da comunidade, também queriam ser guias, Gerson relata que foi muito gratificante ter sido guia, pois teve o privilégio de conhecer muitos lugares e pessoas importantes, conquistando muitas amizades.
Nelson Francisco Terena, residente na aldeia Jaguapiru, relatou que, quando veio para Dourados em 2005, percebeu uma grande diferença, na reserva a cultura era comercializada, enquanto na aldeia onde morava, em Bananal a cultura tradicional não tinha tanto destaque quanto em Dourados.
Lidimara Francisco Terena residente em Dourados, mencionou que, em meados de 2000, ficou surpresa ao ver, que na Reserva de Dourados os maracás, estavam sendo comercializados, haviam muitos e todos podiam tocar e comprar, diferente do que acontecia na sua aldeia, onde o maracá era um objeto sagrados, não eram comercializados, não podiam ser tocados a não ser pelo pajé(Koixomoneti) e cada um confeccionava o seu, colocando dentro, dente de cascavel ou ossos de animais.
Apesar do contato e influências de outras culturas, a comunidade Terena, residente em Dourados, sempre buscou manter a essência da cultura, seguir e repassar as crianças os ensinamentos sobre a tradição Terena, para mantê-la viva, além do ensino da língua indígena.
CONFECÇÃO DO TRAJE TÍPICO MASCULINO
No início, o traje típico da dança masculina, eram revestidos com materiais brilhosos, usavam calção e colocavam o traje por cima. Devido a ausência de penas de origem animal, para confecção dos trajes masculino, a comunidade Terena da reserva indígena de Dourados, passou a adaptar o material de confecção dos trajes típicos, antes a pena de ema, vinha do Pantanal, lugar onde havia muita ema, mas o acesso ficou difícil, logo foram informados que no Paraguai vendiam um espanador feito de pena de ema, e quando algum conhecido se deslocava pra lá, traziam para o grupo, assim, buscavam manter a originalidade do vestuário masculino; Antes cada componente do grupo de dança, confeccionava o seu traje típico e deixava pronto para apresentações, é importante destacar que na cultura terena somente o cacique(nâti) usava o cocar de pena de ema, os outros usavam cocares feito de penas de outros animais como de gavião ou arara.
CONFECÇÃO DO TRAJE TÍPICO FEMININO
Para confeccionar os trajes típicos femininos, a comunidade Terena de Dourados se deslocavam até a aldeia de Buriti, com o auxílio da Funai, que doava cestas básicas para ficarem na aldeia por um determinado tempo, colhendo o material chamado de Membeca uma palha que dava no brejo, colhiam e traziam para a reserva, a ideia era com esse material inovar nos trajes femininos, a palha era trançada e transformavam em vestuário feminino para a dança das mulheres, antes as mulheres usavam trajes feitos de tecido de algodão cru, logo passaram a usar, saias feito de palha, na atualidade as mulheres terena usam saias, blusas, vestidos feitas de juta, como também trajes feitos de sementes de pau- brasil, pintadas com grafismo da etnia Terena e colares, tiaras, pulseiras feitas de pau brasil, destaca se também que as mulheres terena não usam cocar na cabeça, apenas tiaras ou adereços artesanais.
GRUPO DE TRADIÇÃO TERENA
No início da década de 90, a família Valério seguia firme, fortalecendo a cultura Terena na Reserva Indígena de Dourados, com o falecimento do cacique(nâti) Cebola-HEWOE (Gilson Felipe Valério) as ações pararam por um tempo, mas retornaram com incentivo do Ancião Guilherme Felipe Valério, que uniu a família novamente, formando o grupo de Tradição Terena, mantendo as apresentações culturais para visitantes e em dias festivos, principalmente na semana dos Povos Indígenas, e assim, seguiam, ensinando a tradição Terena aos filhos, netos e comunidade, nesse período o objetivo do grupo de Tradição, era o fortalecimento e valorização da cultura, até o ano 2019, ano, em que uma pandemia chegou na aldeia, levando o ancião, sua esposa, e um filho, deixando a família Valério sem chão, até o presente momento o grupo de Tradição Terena está em luto, assim as festividades não acontecem por um determinado tempo, Gerson, filho de Guilherme Valério, sempre acompanhou o grupo e participava ativamente, mas também sofreu com a chamada Covid.19, uma pandemia que levou muitos indígenas e entes queridos; Ao receber alta médica, Gerson, decidiu não participar mais das ações culturais, e no momento colabora, com seus relatos de vida e narrativas sobre o povo Terena, possibilitando conhecimentos para a nova geração e comunidade local, uma preocupação, deixada pelo ancião e Líder indígena Terena Guilherme Felipe Valério, no qual foi reconhecido, através do grupo de tradição Terena e muito prestigiado, sempre atendia com presteza os visitantes que vinham conhecer a Reserva Indígena de Dourados.
cacique(nâti) Cebola-HEWOE (Gilson Felipe Valério)
Grupo de Tradição Terena.
AGRADECIMENTOS: Meus sinceros agradecimentos, ao Seu Gerson Felipe Valério, Nelson Francisco, Lidimara Francisco, e Elcir Felipe Valério, pela disponibilidade em compartilhar conosco, conhecimentos, sobre a nossa Cultura Terena, a fim de valorizarmos e repassarmos aos nossos alunos, para que possamos manter a cultura viva na Reserva Indígena de Dourados, estamos compartilhando de forma escrita com objetivo de registrarmos nossa História.
Edição:Egizele Mariano da Silva/Terena, postagem:30/03/2023 Edição e correção: Emislene Silva Mariano/Terena, site:https://marianoegi.wix.com/meusite Entrevistados: Gerson Felipe Valério/Terena, Nelson Francisco/Terena, e Lidimara Francisco/Terena. entrevista realizada em 19/11/2022, 26/11/22 e 24/03/23 fotos, Gerson, Nelson, Lidimara, Édio Valério e Elizabete. Reserva Indígena de Dourados, Francisco Horta Barbosa-Dourados-MS.
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