Relatos de vida: Elcir Felipe Valério, descreve sua trajetória de vida aos alunos da Escola Tengatuí, demonstrando o potencial da mulher indígena Terena, atuando em prol da sua comunidade indígena.
ELCIR FELIPE VALÉRIO
Filha de Guilherme Felipe Valério, Veio para Dourados em Fevereiro de 1962, com 7anos de idade, não falava Português, somente na Língua materna, Terena, se instalaram na casa de seu tio Libano, primo de seu pai.
Elcir, começou a estudar na escola da Missão, recorda que o caminho da escola era formado por matas, se deslocava a pé todos os dias de manhã, havia muitas plantas e frutas nativas, durante a ida para a escola comiam goiaba, mamão, chupavam cana, haviam muitos pés de banana, assim não ficavam com forme, no início não tinha merenda na escola.
Seu pai, recebeu do capitão da Aldeia Jaguapiru, conhecido na comunidade como Jacaré, um pedaço de terra para morar, logo seu pai, começou a derrubada das matas para fazer a roça, e a cultivar: amendoim, feijão, mandioca, batata, ao chegar da escola, a tarde, a tarefa de Elcir era carpir e plantar na roça, sempre ajudou os pais, não tinha preguiça, pois era necessário para sobrevivência da família, quando terminava o trabalho, descansava, no outro dia, fazia tudo novamente, não tinha sapato, andava descalço, puxavam água do poço, como tinham poucas roupas, usava e já lavava, sua infância e adolescência foi trabalhando na roça, não tinham momentos de diversão, como os jovens tem hoje, cresceu trabalhando na roça e estudando, era muito tímida, quieta, observadora, tinha medo de falar em português, pois, tinha muita dificuldade para se expressar e se comunicar com outras pessoas.
Sua primeira oportunidade de emprego, aconteceu, quando uma mulher a convidou para trabalhar fora, sua mãe ficou cismada, mas seu pai a deixou ir, para aprender a fazer as coisas do purutuya, trabalhava na faxina, no período de férias, foi crescendo, estudando até conhecer Dona Lóide, diretora do hospital da Missão Caiuá, continuou estudando na missão a tarde, completou o primário com 12 anos, dona Lóide a inscreveu no curso de auxiliar de enfermagem, o curso durou dois anos, um curso que, não existe mais, recorda que seus pais, foram de carroça da aldeia até a cidade, assistir a sua formatura, que aconteceu na Escola Presbiteriana, já com uma formação, começou a trabalhar na Missão Caiuá, a partir daí, não trabalhou mais na roça, mas trabalhava dia e noite, trabalhou por dez anos na Missão Caiuá, logo se casou, teve três filhas, conseguiu, serviço na cidade, dona Lóide não aceitava sua saída, assim, foi para o hospital evangélico, trabalhando durante um ano, trabalhou no Hospital Santa Rosa na pediatria, foi para Aquidauana, permanecendo por lá, durante um ano, longe da família retornou para a Reserva, atuando novamente no hospital da Missão, por mais dois anos, quando concluíram a construção do Posto de saúde, na Aldeia Jaguapiru, foi convidada para trabalhar, aceitou, pois ficava próximo a sua casa, atuou por mais 10anos, recorda, que viu vários tipos de doenças, como também, vacinou muitas crianças indígenas, o posto estava sempre cheio no início, pois, atendia toda a reserva, diferente de agora, que há mais postos de saúde na reserva e o atendimento é por área.
Devido as situações precárias de muitas famílias indígenas, e a distância até a Missão Caiuá, muitas mães não conseguiam, chegar ao hospital, por falta de condução; Tendo conhecimentos na área da saúde, Elcir, era chamada pela comunidade, para fazer partos domiciliar, tinha seu material específico para isso, as crianças nasciam rápido e normal, relembra de algumas situações, no Sardinha, em que foi chamada para realizar um parto, encontrou a mulher dentro de um buraco, e para retira-la e facilitar o parto, amarrou uma corda e a puxou, fez parto de uma indígena que o marido a levava para o hospital em uma carriola, ao ver que não chegaria a tempo, chamou, Elcir, que fez o parto na própria carriola, quando o transporte chegou a criança já havia nascido, foi encaminhada para avaliação médica no hospital, fez muito parto na escuridão da reserva, apenas com o foco de uma lanterna, como fazia muito parto, tinha uma parceira chamada Adélia, que a ajudava, gostava muito da profissão, sente saudade, se não fosse a idade, ainda estaria trabalhando, mas quando estava prestes a aposentar, por tempo de serviço, sua mãe adoeceu, então passou a dedicar o seu tempo para os cuidados dos pais, sua mãe, só aceitava os seus cuidados, cuidou de seus pais, até o fim de seus dias, aqui na terra, com 70 anos de idade relata sua história de vida, na semana da mulher, foi convidada pela professora Lidimara para contar sua história de vida aos alunos da escola Tengatuí Marangatu, assim, Elcir disse aos alunos: “não tenham preguiça de trabalhar, pois o serviço, não mata ninguém, toda minha vida trabalhei, se tiver oportunidade, aproveite para trabalhar e estudar, quando não souber o que fazer, peça a Deus para ajudá-los, agradeça pela escola que tem´´; Ao final de sua fala, cantou o louvor, Vitória a mim Jesus dará na língua Portuguesa e na Língua Indígena Terena.
Elcir, em seus locais de trabalho:
Relatos de Vida de Elcir Felipe Valério, Edição: Egizele Mariano da Silva/ 23/03/2023, Professora: Lidimara Francisco. disciplina de Língua Terena, postagem: Egizele Mariano da Silva 31/03/2023. Fotos Egizele e arquivo pessoal de Elcir.
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